• Olá Visitante, se gosta do forum e pretende contribuir com um donativo para auxiliar nos encargos financeiros inerentes ao alojamento desta plataforma, pode encontrar mais informações sobre os várias formas disponíveis para o fazer no seguinte tópico: leia mais... O seu contributo é importante! Obrigado.

“O regresso do Ensino Recorrente carece de justificação”

Luz Divina

GF Ouro
Entrou
Dez 9, 2011
Mensagens
5,990
Gostos Recebidos
0


“O regresso do Ensino Recorrente carece de justificação”


imagedownload.aspx




Sérgio Rodrigues, presidente da Associação Nacional de Profissionais de Educação e Formação de Adultos (ANPEFA), refere que esse ensino esvaziou-se pela falta de procura e pelos baixos índices de aproveitamento.
transparent.gif
A Associação Nacional de Profissionais de Educação e Formação de Adultos (ANPEFA) aguarda a publicação da legislação que irá regulamentar os futuros Centros de Qualificação e Ensino Profissional, anunciados pelo Governo. A estrutura quer perceber quais as competências previstas, mas o silêncio persiste da parte da tutela. Temem-se despedimentos e uma forte redução ao nível das ofertas.

Sérgio Rodrigues, presidente da ANPEFA, está apreensivo com o futuro. A partir de janeiro, todos os técnicos dos CNO têm os seus lugares em risco. O responsável alerta para o desperdício de recursos e desmistifica as críticas feitas ao facilitismo do Programa Novas Oportunidades. "Aceitar que o que se aprende fora da escola também tem valor, desde que devidamente refletido, é um processo de ajustamento que demora o seu tempo", afirma.

EDUCARE.PT: A tutela recuou e decidiu manter os CNO abertos até ao final do ano. O que espera que aconteça depois disso?

Sérgio Rodrigues:
Em maio deste ano, a secretária de Estado do Ensino Básico e Secundário anunciou a reconversão dos CNO em CQEP (Centros de Qualificação e Ensino Profissional). Nessa altura foram avançadas algumas competências dos futuros CQEP, nomeadamente ao nível do encaminhamento e reconhecimento e validação de competências. Até hoje, aguardamos a publicação da legislação que regulamente os CQEP e que nos permita perceber melhor o seu enquadramento e competências. Interpelámos, várias vezes, a tutela para obter mais informações mas a ausência de resposta leva-nos a crer que haverá desmembramento e forte redução das ofertas.

E: Teme despedimentos de mais técnicos? O que irá acontecer a estes profissionais?

SR:
Repetidamente ouvimos o presidente da ANQEP, nas suas poucas intervenções públicas, falar do facto de haver muitos técnicos com contrato de trabalho até dezembro de 2013 e tal situação ser um problema que a agência tem de resolver. Tal resolução tem sido muito simples, orientando os CNO para o despedimento das equipas técnicas, independentemente da duração do vínculo laboral.

Obviamente que, a partir de janeiro, todos os técnicos dos CNO têm o seu cargo em risco pois as suas funções serão extintas. Para que os técnicos continuem a exercer funções nos futuros CQEP será necessário que a entidade com quem têm vínculo de trabalho possa concorrer a entidade promotora dos novos centros e que haja autorização para o reenquadramento desses técnicos. Um problema que se põe é saber se em janeiro já haverá CQEP, uma vez que há todo um processo concursal a desenvolver.

Não deixa de ser pertinente pensar que desperdiçar estes recursos técnicos tem também um aumento exponencial dos encargos do Estado. Atualmente, o vencimento da maioria dos técnicos é comparticipado entre 50% e 70% pelo Fundo Social Europeu, via POPH. Futuramente, no quadro previsível de desemprego, o Estado terá de assumir a totalidade dos encargos com as prestações de apoio social, via subsídio de desemprego. Mais uma vez estamos a desaproveitar capital humano e massa crítica que são de elevada importância para o desenvolvimento do país.

E: O que se perde com o encerramento dos CNO? Há trabalho feito e consolidado que se poderá perder?

SR:
Sim, há perdas bastante relevantes que têm vindo a acontecer desde há um ano a esta parte. Há um capital humano e uma experiência acumulada, fruto do trabalho desenvolvido na última década, onde os CRVCC e posteriormente os CNO tiveram um papel fundamental no desenvolvimento de novas práticas, novas metodologias, novos instrumentos de trabalho e avaliação.

Simultaneamente existem redes institucionais desenvolvidas pelos CNO e que integram os centros de formação profissional, associações de desenvolvimento local, IPSS, poderes locais e tecidos empresariais. Estas redes tinham como objetivo desenvolver mecanismos de ajustamento das ofertas formativas e melhorar a eficácia dos encaminhamentos, potenciando a qualificação dos utentes ou trabalhadores das diferentes instituições.

No início de 2011, havia mais de 8000 protocolos de cooperação assinados entre a ANQ/CNO e estas instituições. Destaco, por exemplo, o envolvimento de grandes grupos como a Sonae, Jerónimo Martins, PT, EDP, todos se envolveram e empenharam na valorização e qualificação dos seus quadros. Atualmente, estas redes e contactos são inexistentes, quer por falta de oferta formativa quer por falta de capacidade de resposta dos CNO.

E: É sensata a medida de adequar a oferta dos CNO com as necessidades regionais? De que forma isso deverá ser feito?

SR:
As redes locais que os CNO vinham promovendo são a base para essa adequação. Cada região deve ser vista na sua particularidade, nos seus pontos fortes de sustentabilidade económica, que promove o emprego e o bem-estar das pessoas. Os setores de atividade e as suas necessidades devem ser tidos em conta quando se promove oferta formativa de uma região. Outro indicador a ter em conta é a saturação em algumas áreas profissionais. O estudo da ANESPO em parceria com a ANQ, que foi publicado no final do ano passado, é revelador das reais necessidades de formação, nas diferentes áreas de atividade económica.

E: A formação de adultos passa para o Ensino Recorrente e os CNO perdem competências. Este "desmembramento", na sua opinião, irá resultar?

SR:
O regresso do Ensino Recorrente carece de justificação. Todos sabemos da sua ineficácia e dos pobres resultados atingidos com os módulos capitalizáveis. Esta modalidade não se coaduna com o paradigma de aprendizagem ao longo da vida. O Ensino Recorrente esvaziou-se a si próprio pela falta de procura e pelos baixíssimos índices de aproveitamento.

Creio que só haverá números significativos de pessoas a frequentar o Ensino Recorrente se não houver mais nenhuma modalidade de educação e formação, e mesmo esse número será substancialmente inferior em comparação com o envolvimento que a Iniciativa Novas Oportunidades criou.

E: O Programa Novas Oportunidades tem sido criticado pelo facilitismo do seu modelo de ensino. Essas observações são justas?

SR:
A questão principal está na mudança de paradigma. Começou a ser possível reconhecer, validar e certificar aprendizagens que as pessoas desenvolvem em contextos informais e não formais. Aceitar que o que se aprende fora da escola também tem valor, desde que devidamente refletido, é um processo de ajustamento que demora o seu tempo. Valorizamos demasiado a avaliação do conhecimento em detrimento da competência. A OCDE, por exemplo, já alertou para o facto de avaliar não ser só dar notas e testar conhecimentos.

O método de avaliação utilizado em processos RVCC foi extremamente elogiado pelo constante reforço motivacional do aluno e pelo papel que este tem na sua própria avaliação. Tal situação coloca o indivíduo no centro do processo de aprendizagem e, desta forma, responde mais eficazmente às novas aprendizagens que terá de desenvolver. Quem, passados todos estes anos, continua a falar de facilitismo ou falta de rigor não é sério e revela um total desconhecimento da evolução das ciências da educação.

E: A nível internacional, o método tem sido elogiado... O que está a falhar?

SR:
As avaliações, quer nacionais quer internacionais, têm sido globalmente positivas apontando sempre pontos a melhorar. É o percurso normal de um processo evolutivo.
Internacionalmente, a EU e a OCDE têm afirmado continuamente o seu apreço pelo trabalho que Portugal desenvolveu no que diz respeito ao combate dos baixos níveis de qualificação e o bom aproveitamento dos fundos comunitários neste eixo estruturante para o país.

Ao nível nacional, temos algumas avaliações desenvolvidas. O CNE (Conselho Nacional de Educação), nos relatórios que desenvolve sobre o estado da educação, fala da extraordinária importância e mais-valia das novas práticas e metodologias utilizadas na educação e formação de adultos. A Universidade Católica concluiu, através da avaliação que desenvolveu, que houve um aumento significativo das competências informáticas e uma maior predisposição para a aprendizagem e formação contínua. Falta ainda uma avaliação séria às competências dos adultos portugueses, comparando-os com cidadãos de outros países. Esse estudo está pronto a ser aplicado (PIAAC), foi testado pelo INE e desconhecemos as razões para estar na gaveta.

E: A tutela diz que este modelo de ensino não tem impactos significativos em termos de empregabilidade e no aumento de remunerações. Aceita estas explicações?

SR:
O IST (Instituto Superior Técnico) fez, recentemente, uma avaliação de impactos de remuneração e empregabilidade dos participantes em modalidades EFA. Fizemos uma análise crítica ao estudo, recorrendo a especialistas nas áreas das políticas públicas de educação, da educação de adultos e das metodologias de avaliação.

Este estudo tem erros metodológicos graves tais como a inexistência de características iguais entre grupo de participantes e grupo de controlo, a falta de ajustamento entre bases de dados, etc. Para além disso, no atual contexto económico e social do país, com congelamento de carreiras e aumento do desemprego, não me parece correto analisar estes impactos.

E: A associação tem tido poder reivindicativo? Tem sido ouvida?

SR:
Desde o primeiro momento que um dos objetivos da ANPEFA é ser um parceiro institucional dos organismos competentes. Fizemos vários pedidos de audiências e fomos recebidos por grupos parlamentares, comissão parlamentar de educação, CNE, FNE e FENPROF. Em todas estas reuniões, as diferentes entidades reforçaram a importância do papel da ANPEFA na definição das futuras políticas EFA.

Recebemos, ainda, um apoio fundamental da FENPROF no que diz respeito à defesa dos interesses e direitos dos profissionais EFA. O apoio jurídico dos sindicatos afetos à FENPROF tem sido fundamental para esclarecer situações como a compensação por caducidade ou os despedimentos por extinção do posto de trabalho. Não obstante os repetidos pedidos, a ANQEP, o MEC e o MEE nunca se dignaram receber-nos e ouvir as nossas propostas.

E: O que espera deste Ministério da Educação? Quais as expetativas?

SR:
As expectativas em relação à atuação do Ministério da Educação são inexistentes. As declarações sobre o trabalho que foi desenvolvido ao longo destes anos demonstram o desprezo e dissonância de ideias. Todas as ações que foram tomadas até agora tiveram como objetivo aniquilar o que foi feito. Não existe nenhum setor da área da educação que aprove a postura arrogante e autoritária do ministro Nuno Crato.

E. O aperto orçamental na área da educação ajuda a explicar as medidas da tutela, nomeadamente o encerramento de alguns CNO?

SR:
Vivemos um período de assistência financeira com mecanismos de austeridade que não podemos ignorar. No entanto, há áreas onde o Estado tem de garantir o seu apoio. A educação é uma delas. Investir na educação não deve ser visto como uma despesa. Preparar melhor as futuras gerações e assegurar respostas eficazes às gerações atuais é estruturante e vital para o nosso país. Tenho, inclusive, sérias reservas sobre a contenção de custos com as novas medidas a desenvolver.

O Ministério da Educação fez alguma projeção de custo por aluno, comparando o Ensino Recorrente com o Programa Novas Oportunidades? Terão as futuras medidas comparticipação do Fundo Social Europeu como têm as atuais? Estas questões deviam ser seriamente analisadas.




educare
 
Topo