Conceitos abstractos precisam-se e a Edge foi à sua procura

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A pergunta: “Que conceito científico permitiria melhorar a caixa de ferramentas cognitivas de toda a gente?”



Qual será o conceito científico que, se toda a gente o dominasse, poderia representar um salto imenso na capacidade que as pessoas têm de perceber e participar activamente nos assuntos do mundo?


Esta é, na sua essência, a pergunta que o norte-americano John Brockman, agente literário e director do site edge.org , colocou em finais de Dezembro a uma constelação de cientistas mundialmente famosos, cujas respostas foram publicadas online esta madrugada.

A pergunta foi formulada, mais exactamente, da seguinte maneira: “Que conceito científico permitiria melhorar a caixa de ferramentas cognitivas de toda a gente?”
Como não é tão directa e explícita como algumas das suas predecessoras (a pergunta do ano passado, por exemplo, foi “Como é que a Internet está a mudar a nossa forma de pensar?”) a Edge apressa-se a contextualizá-la.

A questão é que, segundo James Flynn, especialista em inteligência humana da Universidade de Otago, na Nova Zelândia, existem palavras e pequenas expressões – como “mercado”, “selecção natural”, etc. – que constituem “abreviaturas conceptuais” (shorthand abstractions, ou SHA) que representam na realidade uma constelação de conceitos tão abstractos como complexos e que, “apesar de extremamente sucintas, têm imensa utilidade para perceber o mundo”.

A ideia de Flynn é que as SHA “penetraram no repertório cognitivo das pessoas instruídas, expandindo as suas capacidades intelectuais ao ficarem disponíveis sob a forma de unidades cognitivas que podem ser utilizadas como elementos de raciocínio e debate”. Dito por outras palavras, um economista, quando fala de “mercado” ou um especialista de biomedicina quando pensa num “grupo de controlo”, ou um estatístico quando fala de “amostra aleatória” sabem tão bem de que se trata que não precisam de perder tempo a reprocessar estes conceitos de cada vez que os usam.

Até à noite desta sexta-feira tinham respondido ao desafio 115 pessoas, cientistas das mais diversas áreas do conhecimento. Algumas respostas são extensas e muito complexas. Outras não respondem exactamente à pergunta. Mas há, como sempre, abordagens para todos os gostos e a maior parte é suficientemente interessante para valer a pena ir lá espreitar.

No reino da incerteza

Antes de mais e para abrir o apetite dos mais curiosos, aqui ficam alguns espécimes do autêntico bestiário de SHA criado pelos que responderam: a falácia do espelho, o conceito de GIGO (“garbage in, garbage out”), o TANSTAAFL (“There ain’t no such thing as a free lunch”), o fisicalismo disteleológico, a antifragilidade, o pragmamorfismo, o ARISE (Adaptive Regression In the Service of the Ego), o Findex, a Kakonómica e o... Free Jazz.

O conceito que parece recolher mais votos, em torno do qual vagueiam muitas das respostas, é o de que o mundo é um lugar onde reina a incerteza, onde os fenómenos nunca podem ser quantificados de forma precisa por uma única medição, por valores numéricos exactos. Se as pessoas percebessem melhor “que o mundo é imprevisível” (Rudy Rucker, matemático e escritor), se percebessem realmente o acaso (Charles Seife, professor de Jornalismo, Universidade de Nova Iorque), a “inutilidade da certeza” (Carlo Rovelli, físico da Universidade de Aix-Marseille), o conceito de incerteza (Lawrence Krauss, físico da Universidade Estadual do Arizona), se houvesse uma maior “capacidade de lidar com incertezas de maneira informada” (Gerd Gigerenzer, psicólogo do Instituto Max Planck), se soubéssemos realmente o que é uma distribuição probabilística (John Allen Paulos, matemático da Universidade Temple), isso tornaria as pessoas mais capazes de compreender o mundo. “A simples noção de distribuição (...) serve para as pessoas perderem a ilusão de que a certeza e as respostas numéricas precisas são sempre atingíveis”, escreve Paulos.

Avaliar os riscos

Parte da tarefa cabe aos próprios cientistas, escreve Aubrey de Grey, especialista em gerontologia, e prende-se com a sua capacidade de comunicar ao público as incertezas dos seus resultados. “Se o público pudesse perceber melhor como avaliar os riscos inerentes à exploração de tecnologias futuras e os méritos de aceitar um certo nível de risco a curto prazo no interesse dos muitíssimos maiores benefícios potenciais a longo prazo, o progresso em todas as áreas da tecnologia – e especialmente na área biomédica – ficaria grandemente acelerado.”Num contexto totalmente diferente, George Dyson, historiador da ciência, escolheu a computação analógica como o seu SHA favorito. Nesta era digital, parece fora do sítio, mas não é, argumenta: “Os computadores com a maior taxa de crescimento em 2010 – o Facebook e o Google – são grandes computadores analógicos de um género novo e importante. [...] Embora estas redes analógicas possam ser compostas de processadores digitais, é no domínio do analógico que as computações interessantes estão a ser realizadas.”


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