Juiz obrigado a ler dois milhões de e-mails
O que fazer a cerca de dois milhões de «e-mails» apreendidos na ‘Operação Furacão’? Como se trata de correspondência privada, só o juiz de instrução, Carlos Alexandre, os pode ler e decidir o que interessa para a investigação. Ora, feitas as contas, o magistrado teria que ler mais de 5 mil por dia para, ao fim de um ano, ter esta parte do processo resolvida. A solução encontrada deverá passar pela compra de um software que faça o varrimento dos ficheiros e, através de palavras-chave, identifique a correspondência com interesse para os autos.
Para já, os milhões de «e-mails» apreendidos em bancos, empresas e residências particulares estão comprimidos em 200 CD guardados no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC). “O DCIAP pediu ao Serviço de Informática Tributária da Direcção-Geral de Contribuições e Impostos meios para auxiliar o juiz na análise dos «e-mails»”, disse ao Expresso um procurador do Ministério Público. Também foi solicitada a compra de sofware à Direcção Geral da Administração da Justiça (DGAJ): “Foi solicitado software por parte do Tribunal Central de Instrução Criminal. O software denomina-se ‘encase forensic’. Não podem ser dados mais pormenores por questões de confidencialidade”, disse a DGAJ ao Expresso. Mas, mais informação pode ser consultada em
http://www.guidance-software.com.
O processo conta, até agora, conta com 200 arguidos. Os magistrados decidiram partir o inquérito principal em 10 processos. “Identificadas as estruturas que terão sido utilizadas para a fraude, bancos, empresas e clientes foram agrupados em blocos”, revelou um procurador.
Certo é que até os meios informáticos chegarem, um despacho do juiz do início de Junho já está a motivar uma série de recursos. Apesar de o Procurador-geral da República, Pinto Monteiro, ter afirmado publicamente que, até ao final do ano, haveria resultados da ‘Operação Furacão’, o procurador responsável pelo caso, Rosário Teixeira, pediu o prolongamento do segredo de justiça até Junho de 2009. Este já é o prazo que o MP considera como “objectivamente indispensável” à conclusão da investigação.
No requerimento, o procurador invoca a complexidade da investigação, o cruzamento de alguns dados que ainda estão por realizar e a análise de muita documentação apreendida. Ou seja, a investigação já invocou o último argumento previsto no novo Código do Processo Penal para a manutenção do segredo. Os advogados de bancos, empresas e arguidos estão já a preparar recursos para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL).
Este passo pode, segundo fontes da investigação e advogados de defesa ouvidos pelo Expresso, levantar muita polémica: se o MP, que domina o processo, considera que precisa de mais um ano para investigar, até que ponto os juízes-desembargadores podem recusar tal pretensão? Sendo certo que, numa anterior decisão, a Relação de Lisboa já obrigou o juiz de instrução a reformular um despacho de prolongamento do segredo de justiça.
Gota no oceano
Na semana passada, o grupo Amorim e a Fábrica de Tabacos da Madeira, de Joe Berardo, foram os últimos alvos da equipa que está a investigar. Mas, de acordo com informações recolhidas pelo Expresso, as suspeitas sobre os dois empresários são “uma gota no oceano” quando comparadas com outros casos.
P & R
O que é a ‘Operação Furacão’?
É um processo do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) que começou com uma averiguação da Inspecção Tributária de Braga. Os inspectores das Finanças detectaram a utilização de um esquema bancário que permitia às empresas obter benefícios em sede fiscal. O processo ‘desceu’ para Lisboa e, em Outubro de 2005, iniciaram-se as primeiras buscas aos bancos: BPN, Finibanco, Millenniumbcp e BES. Entretanto, grandes empresas como a Delta Cafés, Soares da Costa, Mota-Engil, passando pelas editoras Porto e Texto Editora, empresas fiduciárias e escritórios de advogados - também estas foram alvos de buscas.
O que está em causa no processo?
As suspeitas estão relacionadas com um esquema que terá permitido às empresas simularem relações comerciais com outras sediadas em Inglaterra e na Irlanda de forma a, posteriormente, poderem abater tais despesas junto do Fisco. A investigação apurou que muitas das empresas no exterior eram fictícias. Há ainda suspeitas de que o valor gerado pela simulação possa, depois de passar por «off-shore», ter caído em contas pessoais. Os bancos são suspeitos de venderem a fraude como um normal ‘produto’ bancário.
@ Sábado